Milicianos são usados para refrear e matar manifestantes na Nicarágua

Por Diego Zerbato

Para a Folha de São Paulo.

As 264 mortes ocorridas nas manifestações na Nicarágua já equivalem a 60% das vítimas de assassinatos em 2017 no país que tem a menor taxa de homicídios da conflagrada América Central: 6,8/100 mil habitantes. O saldo, porém, marca uma diferença em relação às ondas de protestos na América Latina.

A maioria dos 125 mortos nas manifestações contra o líder venezuelano, Nicolás Maduro, entre abril e julho do ano passado, e dos 22 do movimento contra a reeleição do direitista Juan Orlando Hernández em Honduras, em novembro e dezembro, foi alvo de forças oficiais.

Na Nicarágua, a polícia tem poder letal menor que as milícias pró-governo. Análise feita pela Folha das informações do Centro Nicaraguense de Direitos Humanos (Cenidh) entre 19 de abril e 18 de junho mostra que 48% dos óbitos com armas de fogo foram atribuídos a civis e 41%, a policiais.

Os documentos também indicam que a maioria dos mortos por armas de fogo foi atingida em regiões vitais, como peito e cabeça. A frequência é maior em dias de grandes protestos, o que coincide com as  denúncias de uso de franco-atiradores.

A participação desses paramilitares na repressão é mais articulada e decisiva que a dos coletivos na Venezuela. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e as ONGs Anistia Internacional e Human Rights Watch relatam a cessão de carros e de armas de grosso calibre a eles.

“Esses grupos atuaram com coordenação ou com a presença da polícia nos mesmos locais onde ocorreram os ataques. Em alguns casos, a polícia estava com uma postura completamente passiva, em outros, nem estava presente”, disse Pilar San Martín, investigadora de crises da Anistia Internacional que esteve na Nicarágua entre abril e maio.

A ação se reforçou no último mês, principalmente no interior. Foram milicianos que sitiaram opositores em uma igreja em Diriamba, no sudoeste, e que agrediram na última segunda (9) a comitiva liderada pelo arcebispo de Manágua, Leopoldo Brenes, para negociar a saída do grupo.

Robert Muggah, diretor de pesquisa do Instituto Igarapé, especialista em segurança pública, considera que, se prolongada a repressão, há risco de que os opositores migrem dos morteiros caseiros para as armas de fogo modernas. “Os paralelos com a violência política dos anos 1970 e 1980 são dolorosamente óbvios.”

Para ele, a ação das forças de segurança contra a população civil na Nicarágua quebra o padrão usado pelo país desde a década de 1990 no enfrentamento da violência.

“O governo sandinista começou a diminuir o policiamento comunitário. Há crescentes sinais de corrupção e politização dos militares e das agências policiais.”

The Igarapé Institute uses cookies and other similar technologies to improve your experience, in accordance with our Privacy Policy and our Terms of Use, and by continuing to browse, you agree to these conditions.

O Instituto Igarapé utiliza cookies e outras tecnologias semelhantes para melhorar a sua experiência, de acordo com a nossa Política de Privacidade e nossos Termos de Uso e, ao continuar navegando, você concorda com essas condições.

Pular para o conteúdo