Medindo os custos econômicos da criminalidade no Brasil

13/06/2018
Por Robert Muggah e Ilona Szabó
Publicado originalmente no O Globo

A sociedade brasileira sofre com os crescentes índices de criminalidade. Embora represente apenas 3% da população mundial, o Brasil é responsável por 14% dos homicídios mundiais. O ônus econômico é estarrecedor, chegando a cerca de R$ 285 bilhões, ou seja, 4,38% do PIB anual do país. Os crimes violentos representam um grande obstáculo para o crescimento econômico do país, e um gasto a mais pago pelos brasileiros.

É impossível precificar a dor e o sofrimento das vítimas, de seus amigos e dos familiares. Além dos danos físicos, as cicatrizes psicológicas e emocionais podem durar por toda a vida. Mas uma avaliação rigorosa é necessária para o estabelecimento de prioridades e para medir a eficácia das medidas implementadas.

Um novo estudo da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, “Custos econômicos da criminalidade no Brasil” , ajuda a entender a dimensão do problema. Por meio de uma revisão inédita de estatísticas ao longo de duas décadas, o relatório mede o custo dos crimes violentos em setores como saúde pública, justiça criminal e segurança privada; além de examinar a perda de receita potencial em decorrência das mortes, ferimentos e encarceramento de jovens provocados pela criminalidade. É um alerta para todos os brasileiros.

O custo dos crimes violentos tem aumentado em grande velocidade. Em 2015, o último ano com dados disponíveis, 1,36% do PIB foi gasto em segurança pública e 0,94% com segurança privada, sem contar outras despesas, como processos judiciais (0,58% do PIB), encarceramento (0,26% do PIB) e despesas médicas (0,05% do PIB). Cada jovem morto representa perdas produtivas de R$ 550 mil. Os prejuízos acumulados chegam a R$ 450 bilhões desde meados dos anos 1990.

Os gastos do governo brasileiro com o combate ao crime também aumentaram substancialmente: mais de 170% desde os anos 1990. A taxa de crimes violentos aumentou de forma constante no mesmo período, sugerindo que o montante já despendido se mostrou ineficiente e ineficaz. A estratégia que privilegia a repressão policial generalizada e o encarceramento em massa não diminuiu a criminalidade. Embora deem uma sensação temporária de segurança, medidas como essas são dispendiosas e trazem poucos resultados.

A boa notícia trazida pelo estudo é que há várias medidas eficazes do ponto de vista econômico comprovadamente eficientes para prevenir e reduzir o crime. Alguns exemplos são o policiamento por manchas criminais e a dissuasão focalizada, que alocam agentes de segurança em áreas com alta concentração de crimes, estratégias que, quando bem implementadas, já demonstraram ser capazes de reduzir a violência armada. Do mesmo modo, vários tipos de regulamentação das armas de fogo — em particular as restrições a certos tipos de arma e ao porte em público — reduzem significativamente os índices de criminalidade.

Políticas de condenação e encarceramento mais inteligentes também podem contribuir para a redução do custo da criminalidade. É claro que crimes violentos devem ser punidos. Por outro lado, para crimes não violentos e réus primários, medidas não privativas de liberdade são mais eficazes em termos de segurança pública e poupam o dinheiro do contribuinte. Alternativas de educação, formação profissional, tratamento à dependência química e justiça restaurativa também ajudam a reduzir a reincidência e a dotar a população carcerária de capacidade produtiva.

É essencial, ainda, realizar ações focalizadas para transformar os espaços públicos. Medidas que fomentem a existência de infraestrutura e transporte público de qualidade, áreas verdes e espaços comunitários de lazer em regiões de alto risco já provaram ser efetivas na redução da criminalidade. Do mesmo modo o são medidas temporárias de regulamentação de bebidas alcoólicas — por meio de taxação, controle de preços e restrições de horários. O fornecimento de iluminação pública e câmeras inteligentes também está associado à redução de certos tipos de crime.

Para diminuir os custos da criminalidade, é preciso pensar no curto e no longo prazo. As estratégias mais eficientes e eficazes no controle da criminalidade começam na primeira infância: consiste em oferecer o apoio necessário para evitar que jovens optem pela criminalidade. Tiveram resultados positivos, por exemplo: acompanhamento médico domiciliar, programas pré-escolares, o desenvolvimento de competências parentais, acompanhamento sociopedagógico infantil, programas escolares, tutoria comunitária, medidas de contenção da evasão escolar e programas de controle da agressividade.

Em um momento de crise fiscal do governo central e dos estados, é preciso fazer mais com menos, buscando soluções de baixo custo e maior impacto. Se o Brasil quer controlar a violência, precisa prestar mais atenção ao custo-benefício de se prevenir e reduzir a criminalidade. Precisamos urgentemente adotar medidas baseadas em evidências. Boas intenções não bastam. O velho ditado diz que “o crime não compensa”. No caso do Brasil, isso é literalmente verdade: somos nós que pagamos a conta.

Robert Muggah é diretor de pesquisa do Instituto Igarapé, e Ilona Szabó de Carvalho é diretora executiva da instituição

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