É preciso ir além
A sociedade como um todo paga um alto custo pelo enorme número de presos provisórios, que passa de 40% do número total de pessoas privadas de liberdade. A morosidade da Justiça e o não cumprimento das diretrizes da Lei de Execução Penal pelos governadores são fato em basicamente todos os estados. O resultado disso é que milhares de pessoas que não representam ameaça à sociedade são misturadas a criminosos violentos e têm suas vidas manchadas pela prisão. Como bem retrata a pesquisa de 2015 do Instituto Sou da Paz e do CESEC, os presos são provisórios, mas os danos são permanentes.
A presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, demonstra coragem ao trazer à mesa a visão de que a atual crise não é apenas uma questão do sistema penitenciário, mas de toda justiça criminal. E chama o Judiciário, na figura do colegiado de presidentes dos Tribunais de Justiça, acostumados a pensar de maneira descentralizada, a agirem em conjunto para diminuir o número de pessoas sem sentença, como demanda a situação. Mas é preciso ir além. Todos os entes federativos e os três poderes precisam assumir suas responsabilidades e receber apoio da sociedade na resolução da grave crise do sistema de segurança pública e justiça criminal que se arrasta há décadas.
Em paralelo a reduzir o estoque de presos em prisões desumanas, é imperativo frear a entrada de pessoas nos sistemas de medida socio-educativo e prisional. Os prefeitos precisam investir na prevenção, focalizando políticas sociais em locais, grupos e comportamentos vulneráveis à violência. O STF e o Congresso devem rever a Lei de Drogas, que ainda insiste em criminalizar usuários e a punir de forma desproporcional pessoas do baixo escalão da cadeia do tráfico de drogas, como as chamadas mulas, muitas dessas, mulheres. E o Ministério da Justiça pode ser um grande articulador ao implementar o seu Plano de Segurança Pública.
É necessário ainda garantir que quem entra no sistema tenha a chance real de reabilitar-se. Para tanto, penas alternativas à prisão e o fortalecimento dos programas de liberdade assistida para adolescentes em conflito com a lei são chave. Investir na infraestrutura de presídios e na atenção aos presos em regime fechado, proporcionado estudo e trabalho, também.
E para completar, beneficia a todos promover a reintegração desses cidadãos à sociedade. Não é inteligente criar obstáculos ao reingresso dessa pessoa à sociedade. E o setor privado pode cumprir um importante papel, em firmar parcerias e aumentar o número de vagas destinadas a ex-detentos.
Por Ilona Szabó de Carvalho
Artigo de Opinião publicado em 13 de Janeiro de 2017
O Globo