Após escândalos de desvios de armas e munições, CCJ do Senado pauta votação do PL 3.723/2019: institutos Igarapé e Sou da Paz lançam nota técnica analisando argumentos falsos usados na defesa do projeto

Proposta prevê porte para caçadores, atiradores e colecionadores (CACs) e limita rastreamento de armas e munições após três anos de edição de normas que facilitaram o acesso a grandes arsenais

 

A Comissão de Constituição e Justiça anunciou, nesta quarta-feira (16/02), a apreciação do PL 3.723/2019 para a reunião da próxima semana (23/02). Trata-se do projeto de lei apresentado pelo Executivo ao Congresso que representa um dos maiores retrocessos no controle de armas e munições do país. O projeto, já apelidado de “PL da Bala Solta”, facilita ainda mais o acesso dos caçadores, atiradores e colecionadores (CACs) às armas e munições, prevê o porte para essas categorias e limita o rastreio desses equipamentos. 

 

O anúncio da apreciação do PL pela CCJ acontece na sequência de casos de grande repercussão que exemplificam os riscos da instrumentalização dos registros dos CACs para a compra e o desvio de armas e munições para a criminalidade. No final de janeiro, Victor Furtado, registrado como CAC no Exército, foi preso junto com um arsenal de mais de R$ 3 milhões que seria comercializado para o crime organizado no Rio de Janeiro. No último dia 10, a Polícia Federal deu início à Operação Confessio, contra um esquema de falsificação de documentos emitidos pelo Exército para facilitar a venda e o porte de armas.

 

Defensores do projeto alegam que ele garantiria a “segurança jurídica” para essas categorias. Para rebater e desmistificar este e outros falsos argumentos favoráveis à aprovação do PL, os institutos Igarapé e Sou da Paz divulgam a nota técnica “Os falsos argumentos apresentados em defesa do PL 3723/2019 sobre caçadores, atiradores e colecionadores”. No documento, as organizações rebatem cinco argumentos falaciosos que estão sendo usados na defesa do projeto, e alguns dos principais perigos que ele representa. São eles:

 

ARGUMENTO FALSO 1: “Se o PL 3.723 não for aprovado, será o fim do tiro desportivo no Brasil e milhares de pessoas ficarão desempregadas.”

Por que é falso? A regulamentação do tiro desportivo no Brasil já existia antes da publicação dos decretos presidenciais sobre o tema e da apresentação do PL 3.723/2019 e nunca impediu a prática de alto nível no Brasil, que inclusive, conquistou medalha nas Olimpíadas de 2016.

 

ARGUMENTO FALSO 2: “O PL 3.723/2019 é muito mais restritivo e acaba com vários direitos dos CACs.” 

Por que é falso? O projeto define como “direito de todo cidadão brasileiro” as atividades de tiro desportivo, colecionamento e registro de armas para caça (proibida no país). Além disso, estabelece um limite mínimo de compra de armas, e não máximo, e prevê como papel do Exército incentivar a atividade, em flagrante conflito com a atribuição do órgão regulador e fiscalizador da atividade e garantidor da ordem pública e defesa nacional.

 

ARGUMENTO FALSO 3: “Esse projeto não tem nada a ver com defesa pessoal, ele é sobre a regulação de uma atividade esportiva.” 

Por que é falso? Na prática, o PL 3.723/2019 garante a possibilidade do porte de armas para todos os atiradores desportivos com mais de 5 anos de registro e uma arma no acervo, além de autorizar o transporte de arma municiada, em qualquer horário e trajeto, indo na contramão da proibição do porte de arma de fogo no país. Essa autorização em nada se relaciona a qualquer atividade desportiva ou de lazer, e configura um porte de arma camuflado aos quase meio milhão de atiradores registrados no país.

 

ARGUMENTO FALSO 4: “O projeto é sobre os atiradores desportivos, não tem a ver com segurança pública.”

Por que é falso? Toda atividade econômica ou esportiva tem que ser regulada considerando o interesse público e os riscos individuais e coletivos ligados à prática. Armas, munições e pólvora, entre outros itens, estão na lista de produtos controlados pelo Exército exatamente pelo impacto que eles possuem na ordem e segurança públicas. Seu descontrole aumenta os riscos de que grupos armados ameacem os direitos da população brasileira e a própria democracia. 

 

ARGUMENTO FALSO 5: “Os crimes não são cometidos com armas de CACs: criminosos não utilizam armas legais.”

Por que é falso? Certamente, há milhares de CACs cumpridores das normas de suas atividades, previstas em lei. A discussão sobre os retrocessos do PL 3.723/2019 não passa pela criminalização dessas categorias. Ao contrário, a preocupação é exatamente evitar que essas categorias sejam utilizadas como via de acesso a arsenais posteriormente desviados para a ilegalidade, bem como facilitar o trabalho de agentes públicos responsáveis pela prevenção e enfrentamento desses desvios e pela investigação de homicídios. No entanto, os casos envolvendo esses desvios não são poucos ‒ e são gravíssimos.


A apreciação do projeto pela CCJ do Senado se torna ainda mais incoerente quando constatamos o aumento dos registros concedidos a essas categorias ao longo dos últimos anos sem que se aprimorasse a capacidade de fiscalização dos arsenais de armas e munições no país. Em 2020, o montante destinado pelo Governo Federal às operações de fiscalização foi de R$ 3 milhões, 15% a menos do que em 2018 e 8% a menos do que em 2019. No ano passado, mais de 1.000 registros de CACs foram concedidos por dia, em média, pelo Exército. Em dezembro de 2021, havia mais de 1 milhão de registros de caçadores, atiradores e colecionadores ativos, o que representa um aumento de 325% comparado a 2018.

 

Acesse a íntegra do documento

Para entrevistas, por favor contatar através dos e-mails: press@igarape.org.br e imprensa@soudapaz.org.

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