Reflexões sobre a ocupação dos espaços cedidos às mulheres

 

Novembro,  2015

 

“Ocupar espaços cedidos por homens por uma semana não resolve nada.”

É, eu sei. Mas vamos guardar o raio problematizador por um minuto?

A proposta do #AgoraÉQueSãoElas não é ser a revolução feminista definitiva – sinceramente, nem sei se isso passou pela cabeça de alguém que entrou na onda. Acho que todas as mulheres que escreveram durante estes sete dias sabem muito bem o tempo insuficiente que dura uma semana. Sabemos também o quanto duraram os anos, décadas e século de luta por direitos, por respeito e por cidadania que já acumulamos até aqui, o quanto ainda falta conquistar e o quanto o que já conquistamos está sendo posto em risco.

Se te parece melhor, pode entender estes sete dias como uma amostra grátis do que seria uma mídia mais diversa, solta das amarras de ideias tradicionais sobre quais opiniões devem ter lugar reservado. Ou talvez como semente. Semente de feijão leva quanto tempo para brotar? Que não seja de feijão então, mas semente de algo que dê frutos.

Eu, particularmente, espero que esse fruto seja um desconforto, um incômodo, ainda que doce. Primeiro para os grandes veículos. Que, ocupados mesmo que brevemente por mulheres, percebem o quão limitada ainda é sua opinião – e o quão falaciosa é essa pretensa universalidade dos temas de interesse comum. Que os editores tenham a sensibilidade para reconhecer o valor da representatividade e da diversidade de interesses e de pontos de vista.

Em segundo lugar, espero que o desconforto seja também dos homens, mas um incômodo bom, daqueles que não te deixam ficar parado. Que percebam que, cedendo espaço e calando-se para ouvir outras vozes, eles também tem muito a ganhar. A vida em sociedade não é um jogo de soma zero.

Espero principalmente que essa semana de semeio floresça em incômodo para muitas mulheres. Para as que ainda resistem ao feminismo, desejo que se reconheçam, talvez pela primeira vez, nesses textos e que com isso entendam um pouco do que é esse movimento tão bonito. Que essa curiosidade não acabe no domingo. Para todas nós, desejo que ao final destes sete dias percebamos que somos muito maiores do que espaços cedidos e que não dá mais para nos calar. Não dá mais para achar que outros falam por nós.

Que não nos falte a coragem e a força para continuar fazendo de todo silêncio uma pausa semínima – aquela que dura só o tempo suficiente para respirar fundo e retomar a música ainda mais forte, no refrão. Uma semana, de fato, não resolve nada. Sorte que não pretendemos parar.

Ana Paula Pellegrino, O Globo

 

 

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