Nota – Aprovação da PEC 45/2023 no Senado Federal em 16.04.2024

 No dia 16 de abril de 2024, o Brasil testemunhou graves retrocessos em sua abordagem de política de drogas, afastando-se ainda mais de uma postura humana, eficaz e fundamentada em evidências científicas. O Senado Federal aprovou, em duas votações, uma proposta de emenda à Constituição que criminaliza o porte e a posse de drogas, independentemente da quantidade. A intenção é equiparar tal medida às garantias e direitos individuais defendidos pela Carta Magna. 

 

A PEC representa uma resposta legislativa ao julgamento do Supremo Tribunal Federal sobre a descriminalização do porte de maconha para consumo pessoal. E, ainda que precise ser analisada pela Câmara dos Deputados, a ampla maioria favorável nas votações do Senado suscita preocupações.

 

Dentre elas, a proposta perpetua uma lacuna amplamente criticada por especialistas ao não adotar critérios objetivos de quantidade para diferenciar usuários e traficantes, o que reitera pontos frágeis da Lei de Drogas de 2006 e conduz a uma abordagem que trata de uma questão de saúde pública recorrendo ao sistema de justiça criminal, exacerbando desigualdades sociais, estigmatizando usuários e adictos, e indo de encontro às recomendações de comissões internacionais e nacionais e das evidências científicas, inclusive sobre o potencial da cannabis para fins medicinais e científicos.

 

A aprovação da PEC 45/2023 representa um movimento na contramão das políticas adotadas pelas Américas e pelo mundo. Segundo dados do Monitor de Políticas de Drogas nas Américas, dos 36 países do continente americano, 19 já estabeleceram critérios objetivos de quantidade para distinguir uso pessoal de tráfico, enquanto 15 descriminalizam, ao menos, o uso da cannabis, e 8 desses estendem a descriminalização a todas as drogas.

 

O Brasil possui a terceira maior população carcerária do mundo, com 644.794 pessoas privadas de liberdade, e 28,3% dessas estão relacionadas à Lei de Drogas. Desse contingente, quase 68% são pessoas pretas e pardas, evidenciando as disparidades raciais no sistema prisional.

 

O país não precisa aumentar o inchaço do seu sistema prisional com usuários de drogas, que deveriam ser contemplados com tratamento digno e eficaz. Políticas públicas baseadas na repressão generalizada e na abstinência têm se mostrado falhas em todo o mundo. Resta saber até quando o Brasil resistirá às evidências científicas, promovendo mais uma vez uma política cara, injusta e ineficaz.

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