Compromisso com a vida

artigo_jose maria e silva.qxdO projeto de lei 3.722/2012, que revoga o Estatuto do Desarmamento, é equivocadamente apresentado como um avanço do direito de proteção do cidadão

Após as eleições municipais, espera-se que nossos parlamentares retomem diferentes agendas no Congresso. Na segurança pública, é fundamental avançar em projetos que contribuam para a prevenção e redução da violência no país. Precisamos colocar um fim à naturalização de nossas 60 mil mortes violentas por ano.

Entretanto, para consolidar uma sociedade mais segura para todos, os debates e propostas legislativas não podem ignorar as pesquisas sobre os impactos de políticas implementadas no Brasil e em outras partes do mundo.

Representantes de uma sociedade que escolhe a vida, e não a vitimização de seus cidadãos, não podem dar as costas para as evidências do que funciona e do que não funciona. Ignorar tais evidências é, na verdade, ignorar políticas capazes de prevenir e reduzir o inaceitável número de trajetórias interrompidas pela violência. Estamos dizimando nossa juventude, realidade que acarreta custos humanos, sociais e econômicos intoleráveis a nosso país.

Na Câmara dos Deputados, o projeto de lei 3.722/2012, que revoga o Estatuto do Desarmamento, é equivocadamente apresentado como um avanço do direito de proteção do cidadão. Trata-se, no entanto, de uma proposta que vai na contramão do conhecimento acumulado sobre a relação direta entre a circulação de armas de fogo e a maior prevalência de crimes violentos. Centenas de estudos brasileiros e internacionais confirmam a importância da regulação responsável de armas e munições.

Secretários de Segurança, comandantes e chefes de polícia de vários estados do Brasil já se posicionaram contrários à revogação do Estatuto do Desarmamento. Assim como os jovens que vivem nas regiões mais conflagradas de nossas cidades e as vítimas de violência doméstica, para as quais a presença de uma arma na equação da agressão está longe de trazer qualquer forma de segurança, todos estão sendo ignorados pelos defensores desta revogação.

Como cidadãs e cidadãos, trabalhamos pelo direito à vida e à segurança pública e esperamos de nossos representantes ações responsáveis e urgentes para revertermos este quadro de violência e vitimização. As frentes nas quais precisamos avançar são inúmeras.

No campo do controle de armas e munições, precisamos integrar os sistemas de gerenciamento do Exército e da Polícia Federal. Precisamos também aperfeiçoar a fiscalização de categorias como colecionadores, atiradores e das empresas de segurança privada. Nos estados, deve-se fortalecer o controle sobre o material bélico das forças de segurança e as capacidades de custódia e rastreamento das armas apreendidas, fundamentais para o aperfeiçoamento investigativo da polícia.

Armas não trazem mais segurança. Defender o fim do Estatuto do Desarmamento como política de segurança pública é, antes de tudo, uma irresponsabilidade. O que esperamos de nossos representantes no Congresso? Um real compromisso com uma produção legislativa baseada em evidências, e não nos interesses dos que lucram com as 45 mil mortes por armas de fogo a cada ano.

Por Michele dos Ramos, Ivan Marques, Renato Sérgio de Lima e Rubem Cesar Fernandes
Artigo de opinião publicado em 25 de outubro, 2016
O Globo

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