É legítimo barrar a imigração em nome da segurança e do desenvolvimento econômico? NÃO
A decisão dos EUA de suspender a entrada de refugiados e imigrantes de sete países de população majoritariamente muçulmana poderá agravar a pior crise de deslocamento forçado desde a Segunda Guerra.
Além de violar uma série de tratados internacionais, a medida alimenta a percepção equivocada de que a imigração representa ameaça à segurança nacional e ao desenvolvimento econômico de um país.
Vários estudos indicam que imigrantes não apenas contribuem para prosperidade econômica como são menos propensos a cometer crimes do que cidadãos nacionais.
Essa abordagem populista, que exagera os aspectos negativos e omite as oportunidades desencadeadas por fluxos migratórios, não se restringe aos EUA.
A retórica antiglobalização foi decisiva, por exemplo, para o fortalecimento da extrema direita no mundo e para a aprovação do “brexit”. Em outros países europeus, a adoção de leis restritivas e o fechamento de fronteiras tornam dramática a situação de refugiados e imigrantes.
A preocupação excessiva com segurança está atrelada à percepção de o imigrante ser uma ameaça à identidade cultural, linguística e religiosa. Essa ideia resulta, muitas vezes, da propagação de estereótipos e da superestimação das populações estrangeiras.
Muitos americanos acreditam, por exemplo, que 17% da população de seu país é muçulmana, quando a proporção real é de 1%. A maioria dos ataques terroristas perpetrados no país desde o 11 de Setembro não teve participação de imigrantes em situação irregular.
Em contrapartida, outros países valorizam a diversidade gerada pela imigração. Alguns, como Canadá e Alemanha, orgulham-se de receber imigrantes e refugiados. Valorizam o acolhimento não apenas por imperativos morais mas também por enxergarem na diversidade uma possibilidade de crescimento econômico.
A chegada de novos cidadãos ajuda a reverter o quadro de envelhecimento populacional e de declínio das faixas economicamente ativas.
Apesar dos impactos positivos, a opinião pública de muitos países sustenta que a imigração leva à redução dos salários dos locais e ao aumento do desemprego. No entanto, estudos demonstram que imigrantes aportam mais impostos e contribuições sociais do que recebem em benefícios governamentais.
De mesma forma, eles aumentam a oferta de emprego ao longo do tempo. Refugiados, mesmo necessitando de apoio inicial para integração e reabilitação, igualmente constituem fonte valiosa de ideias e práticas inovadoras. Não é à toa que os seis americanos vencedores do prêmio Nobel de 2016 são imigrantes. O físico alemão Albert Einstein era refugiado.
Apesar de sua longa história de imigração, o Brasil acolhe apenas 8.863 refugiados reconhecidos. Em 2015, cerca de 117 mil imigrantes entraram no país. Esse número não representa sequer 0,06% de uma população de mais de 206 milhões.
Em um contexto mundial em que o populismo ganha força, o Brasil deve aprovar modelo de acolhimento que emule o tipo de recepção que se deseja a imigrantes brasileiros.
Deve ainda honrar suas credenciais de liderança regional na recepção de refugiados, apresentando um programa de reassentamento mais amplo e estruturado.
Dessa forma, poderá não apenas usufruir dos benefícios da migração mas também fortalecer a defesa de princípios internacionais cada vez mais ameaçados, como o direito ao refúgio e a liberdade de ir e vir.
Por Adriana Erthal Abdenur, Maria Beatriz Bonna Nogueira e Maiara Folly
Artigo de Opinião publicado em 04 de fevereiro de 2017
Folha de S. Paulo