Policiar áreas perigosas poderia reduzir drasticamente a taxa de assassinatos
24 de Março
Concentrar-se nas cidades, nos bairros — até mesmo nas ruas — onde a atividade criminosa é recorrente não só desloca a violência para outros lugares, mas produz resultados.
Em Bogotá, 99% dos homicídios ocorrem em apenas 1,2% dos endereços da cidade. Em Medellín, 40% de todos os crimes ocorrem em apenas 10 das 168 horas de uma semana.
Os homicídios na América Latina estão concentrados por horário e local, provavelmente mais que em qualquer outra parte do mundo. Para os formuladores de políticas que têm a esperança de reduzir os níveis assustadores de crimes violentos da região, isso representa uma grande oportunidade.
Com apenas 8% da população mundial, a América Latina é palco de 33% dos homicídios no mundo e é desproporcionalmente afetada por outras formas de vitimização, incluindo assaltos, roubos e crimes contra o patrimônio. A maior parte desses episódios ocorre em apenas um punhado de configurações urbanas. As medidas de prevenção que se concentram explicitamente em determinados lugares, pessoas e horários conectados à atividade criminosa recorrente vêm registrando um sucesso notável na região.
As inovações na aplicação da lei e na prevenção social são fundamentais para prevenir assassinatos. Diversos métodos de policiamento, incluindo o policiamento de proximidade, o policiamento comunitário e o policiamento orientado para o problema (POP), ajudaram a reduzir as taxas de homicídio em cidades que costumavam ser notoriamente violentas como Medellín, San Pedro Sula e São Paulo em até 70-90% nos últimos 20 anos.
Embora esses exemplos ofereçam uma visão sobre o que é possível ser feito, essas histórias de sucesso ainda são raras. Políticas e estratégias de prevenção que se concentram nas áreas, pessoas e comportamentos associados a um alto índice de criminalidade precisam urgentemente ser ampliadas e reproduzidas.
Há várias maneiras para que isso possa ser feito, uma vez que se contabilizam os motivos da concentração da atividade criminosa em determinados lugares. Como se poderia esperar, as condições sociais subjacentes desempenham um papel importante na determinação de onde ocorre o crime. Se os laços sociais dentro de uma comunidade são muito fracos para influenciar a forma como as pessoas se comportam, é mais provável que a criminalidade, em particular a delinquência juvenil, ocorra. Da mesma forma, quando há níveis acima da média de desvantagem e desigualdade, uma alta taxa de desemprego juvenil e uma alta rotatividade de moradores, os crimes violentos se tornam mais comuns.
Além disso, a maneira como um bairro é projetado espacialmente pode ampliar ou diminuir os riscos de crimes violentos. O crime é em grande parte resultado das atividades rotineiras dos indivíduos. Potenciais perpetradores regularmente consideram os riscos e recompensas antes de cometer um crime específico, e as oportunidades não são distribuídas igualmente de um lugar a outro. Os potenciais infratores são mais propensos a realizar atos criminosos mais próximos de casa e em áreas que com as quais têm familiaridade.
A violência também se concentra de formas inesperadas. Em termos absolutos, apenas quatro países — Brasil, Colômbia, México e Venezuela — são responsáveis por um a cada quatro homicídios globalmente. Na América Latina, a sub-região do Triângulo Norte da América Central — Guatemala, Honduras e El Salvador — registra consistentemente algumas das maiores taxas de homicídios do mundo. Quando observada mais de perto, porém, essa distribuição está longe de ser uniforme.
Por exemplo, em El Salvador as taxas de homicídios são muito mais altas nos municípios da região Oeste do país que no Leste. Quando examinado dentro dos municípios, esse padrão de concentração do crime continua, revelando certas áreas geográficas com maior predisposição à violência letal que outras. Da mesma forma, no Brasil, nos Estados de São Paulo, Paraná e Paraíba, as cidades e áreas periféricas são especialmente vulneráveis àassassinatos. A maioria dos países e Estados seguem padrões semelhantes.
O nível em que os homicídios se concentram de acordo com a geografia também varia de cidade para cidade e mesmo dentro de bairros específicos. Na Cidade do México, por exemplo, quatro distritos respondem por mais de 25% de todos os crimes. Em Caracas, apenas três distritos respondem por mais de 50% de todos os homicídios. Um estudo recente de cinco países latino-americanos descobriu que 50% de todos os crimes ocorreram em apenas 3% a 8% dos quarteirões.
Fatores temporais — a hora do dia, os dias da semana e o período do mês — também estão estreitamente correlacionados com a incidência de violência homicida. Em cidades brasileiras como Ilhéus e São Paulo, a violência letal é mais comum quando as pessoas têm tempo livre — durante as férias, à noite e nos fins de semana. A probabilidade de que crimes ocorram também aumenta no fim da noite de sábado e nas primeiras horas do domingo, quando as pessoas se reúnem no exterior de casas noturnas e bares.
Finalmente, o perfil das pessoas mais afetadas por crimes violentos também varia de um lugar para outro. Enquanto jovens pobres e não brancos são, de longe, os que correm o maior risco de serem assassinados em toda a América Latina, dentro desse grupo existem subconjuntos com diferentes níveis de risco. Na Cidade do México, por exemplo, a desigualdade econômica e famílias desmanteladas desempenham um papel importante, enquanto que em Monterrey, o desemprego, a presença de escolas e a concentração de jovens do sexo masculino são especialmente salientes. Em Ciudad Juárez, ser um migrante, ter mais de 15 anos, morar perto de imóveis vazios e em áreas com acesso limitado à água são todos fatores fortemente correlacionados com altas taxas de homicídio.
Tudo isso sugere que mais pesquisas sobre como a violência se concentra nas cidades latino-americanas proporcionariam oportunidades para que os recursos policiais e de segurança pública sejam direcionados eficazmente. Os programas de policiamento de áreas de alta criminalidade já mostram evidências claras dessa eficácia e não necessariamente apenas deslocam a atividade criminosa para outro lugar, mas podem de fato diminuí-la em termos absolutos. Uma compreensão mais profunda de como os países são afetados pela violência — região por região, cidade por cidade, rua por rua — proporcionará às autoridades e políticos as ferramentas necessárias para reduzi-la.
As implicações dessas pesquisas são cada vez mais claras. Estudos de organizações como o Banco Mundial, o Banco Latino-Americano de Desenvolvimento, o Banco Interamericano de Desenvolvimento e a Organização dos Estados Americanos mostram que, quando as iniciativas de prevenção da criminalidade combinam o policiamento direcionado com programas de bem-estar socioeconômico, a violência letal diminui.
O experimento da Colômbia com o “Plano Cuadrantes” é um exemplo poderoso. Experimentos similares em Belo Horizonte, Recife, Rio de Janeiro, Santiago do Chile e São Paulo oferecem mais suporte.
Outra chave para reduzir o homicídio é investir no restabelecimento das relações policiais nas comunidades mais vulneráveis. Os bairros que experimentam as maiores taxas de homicídios são tipicamente comunidades onde há um baixo nível de confiança na polícia. O policiamento orientado para o problema fornece uma abordagem prática para combater os mecanismos que causam a criminalidade e pode incluir a construção das bases necessárias para melhorar as relações entre a polícia e a comunidade. A adoção de princípios de POP tem sido eficaz na abordagem de questões difíceis sobre o homicídio relacionado a gangues, bem como homicídios domésticos.
Finalmente, os formuladores de políticas devem reconhecer as oportunidades oferecidas pela intervenção preventiva. Pesquisas em toda a América Latina demonstram de forma convincente que a idade e o nível de escolaridade são fatores-chave que dão forma à exposição a crimes violentos, e que o apoio direcionado a uma renda estável pode desempenhar um importante papel para dissuadir o envolvimento com a atividade criminosa. As intervenções que se concentram no apoio ao desenvolvimento positivo da primeira infância, na ajuda aos pais, no emprego para jovens (incluindo os adolescentes de alto risco e os jovens infratores), no aconselhamento e formação e no acesso à programas sociais (em particular para adolescentes) são eficientes em relação aos custos e têm múltiplos efeitos positivos.