Nós podemos reduzir os índices de homicídios pela metade

 

Agosto, 2015

Por Manuel Eisner

 

Em menos de dois meses, a Cúpula das Nações Unidas irá eleger os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável para os próximos 15 anos. Estes serão os compromissos mais abrangentes que os governos já firmaram com seus cidadãos. A lista de tarefas globais provavelmente clamará pela eliminação do abuso infantil, a erradicação da violência contra as mulheres, a redução das taxas de homicídios e o acesso de todos à justiça. Mas é realmente possível fazer tudo isso? E onde os governos devem investir para melhor proteger aqueles que são mais vulneráveis de abuso sexual, negligência, roubo, violência devido ao crime organizado e tráfico de pessoas?

Eu não acho que a violência doméstica possa ser erradicada num futuro próximo. Mas tenho confiança de que uma redução significativa é viável – se investirmos nas políticas certas. Tomemos os homicídios como exemplo.

Cerca de 475 mil homicídios são cometidos por ano mundialmente. Isso equivale a quase oito milhões de assassinatos desde o começo do milênio, número superior ao total de mortes provocadas por guerras durante o mesmo período. Os homicídios se concentram mais fortemente em regiões, países, bairros e até mesmo em trechos de ruas específicos. Metade de todos os homicídios acontece em 20 países que representam apenas 10% da população mundial. Eles estão na América Latina ou na África Subsaariana.

Então o que poderia fazer cair as taxas de homicídio? O que cidades como Hong Kong ou Rio de Janeiro, e países como Japão ou Noruega fizeram certo para diminuir o número de homicídios em pelo menos 50% num intervalo de duas ou três décadas? Foi uma combinação de fatores. Mas há importantes pontos em comum: ao redor do mundo, os homicídios parecem ter diminuído onde os governos implantaram uma boa governança e um efetivo Estado de direito, freando a corrupção de seus representantes, adquirindo controle sobre os mercados de segurança privada, e aumentando sua legitimidade por meio de instituições inclusivas. Em resumo, onde os cidadãos puderam enxergar bons motivos para obedecer as leis impostas pelo Estado.

Em contrapartida, sociedades com altas taxas de homicídios sofrem, sem exceção, com um sistema disfuncional de aplicação da lei e de justiça penal. Considerem o exemplo de Honduras, que tem os maiores índices de homicídios do mundo. Nesse país da América Central, apenas três em cada 100 assassinatos resultam na condenação dos criminosos. O restante fica impune. Isso é quase um convite para matar numa sociedade onde a pobreza é gritante e as gangues prometem dinheiro e prestígio. E onde o Estado falha em punir assassinos, alguns intervêm, praticando os tipos de ataques de vingança que fazem os números de mortes violentas subirem no mundo todo.

Nesses países, as forças policiais costumam ser corruptas e ineficazes. Muitos suspeitos passam anos definhando em prisão preventiva junto com criminosos condenados. Prisões superlotadas são frequentemente gerenciadas pelo crime organizado, que cobra dinheiro de detentos em troca de segurança para eles e seus familiares. E programas de reintegração e reabilitação para pessoas que saem da prisão praticamente não existem.

Estou convencido, portanto, de que a base de qualquer redução da violência está na aplicação eficaz da lei e na boa governança. Isso exige uma justiça profissional e legítima, proteção eficaz das vítimas, julgamentos rápidos e imparciais, punição moderada e prisões mais humanas. Tornar as polícias, a justiça e o sistema penal mais eficazes, justos e responsáveis é algo que os governos podem conseguir se houver vontade política de fazê-lo.

Este não é um argumento contra medidas preventivas mais amplas que lidam com as raízes profundas da violência. Iniciativas que visam à garantia do desenvolvimento infantil saudável, à modificação das normas culturais que justificam a violência contra mulheres e grupos vulneráveis, à melhoria da educação e ao aumento de oportunidades de emprego, ao planejamento urbano e ao controle do consumo de álcool também têm papel fundamental. Como também é fundamental a expansão do nosso conhecimento sobre as medidas de prevenção e redução da violência que funcionam. Mas sem um efetivo Estado de direito baseado em boa governança, todos os esforços de prevenção serão frágeis, insustentáveis.

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