As reais intenções do Brasil na África
Janeiro, 2015
Robert Muggah e Nathan B. Thompson
O Ministério das Relações Exteriores sempre ressalta sua cooperação com a África. Para os otimistas, algo que não acontecia desde os anos 60. Eles não estão de todo errados. Há dez anos, a África surge como um dos parceiros econômicos brasileiros que mais cresce. As trocas cresceram de US$4.3 bilhões em 2000 para US$28.5 bilhões em 2013. Mas o que está realmente por trás dessa relação? O Itamaraty defende tratar-se de um projeto de cooperação, mas o fato é que o Brasil tem interesses econômicos. Uma relação mais estreita com o continente permite assegurar a influência brasileira no Atlântico Sul.
Areaproximação com o continente africano foi puxada por Lula, que fez 28 visitas oficiais a 21 países. Lá, dezenove das 37 embaixadas brasileiras foram inauguradas na última década. Mesmo com a drástica diminuição do envolvimento externo brasileiro na era Dilma, a África continua gozando de relevância em círculos de política externa. E o país não parou na diplomacia. O BNDES investiu em torno de US$2.9 bilhões em projetos na África desde 2007. A Agência Brasileira de Cooperação (ABC) e a EMBRAPA também estão envolvidas em projetos.
Apesar do entusiasmo, a parceria também tem sofrido seus revezes. A decisão da presidente Dilma de cancelar (ou reestruturar) a soma de US$ 900 milhões de dívidas de países africanos deu errado. A proposta visava reforçar as credenciais brasileiras no continente e expandir o comércio, mas foi criticada por favorecer economias africanas relativamente ricas e corruptas. Enquanto isso, empresas brasileiras tem sido criticadas por corrupção e desrespeito a legislações locais. A Vale, largamente inserida mercado africano, passou por um pesadelo financeiro e de relações públicas por causa de um acordo suspeito de aquisição da concessão de mineração em Guiné Bissau. Levando em conta os escândalos nacionais sobre corrupção atualmente sendo descobertos, essa onda não deve cessar.
Fechar negócios na África é mais difícil do que parece. Os custos de entrada no mercado são altos. Apesar de avanços na redução da pobreza, o continente ainda sofre com grande instabilidade política. Direitos de propriedade são pouco consolidados, há uma falta de transparência institucional, infraestrutura de comunicação e transporte muito desiguais. Ainda assim, há um claro aumento nos níveis de investimento externo.
Hoje, entram no continente fundos públicos e privados 400% maiores atualmente do que em 2000 – em números que devem ultrapassar os US$ 200 bilhões em 2014. Apesar de países como França, Reino Unido e Estados Unidos ainda ocuparem o topo do ranking de investidores por lá, China, Brasil e África do Sul não ficam muito atrás. Só a China investiu por volta de US$27.7 bilhões no continente – quase a metade do gasto total dos países BRICS.
Se o Brasil quer fazer incursões sustentáveis na África, precisa sair na frente. Tendências sociais, econômicas e demográficas mostram que o perfil oportunidades de investimento no continente está mudando. Haverá, nas próximas décadas, uma ênfase menor em indústrias extrativas e mais oportunidades para investimento em bens de consumo e serviços, especialmente na área de novas tecnologias de informação e no setor eletrônico financeiro. Formuladores de política externa e gestores de bancos de desenvolvimento precisam ficar alerta e planejar-se de acordo.
Brasil Econômico